domingo, 31 de maio de 2015

A dor engarrafada




Havia uma mesa no meio da sala, e eu estava em frente a ela. A sala estava parcialmente cheia e a meia luz. No centro da mesa tinha uma garrafa de tequila, e as luzes ali piscavam incessantemente pelo cômodo. As pessoas dançavam, e dentre todas aquelas almas dançantes meus olhos eram total paixão por ela, a tequila, é claro! Eu precisava beber para esquecer cada pedaço de você que havia ficado guardado dentro de mim, como um câncer que parecia crescer sem fim a cada dia mais. E eu realmente não aguentava mais, precisava me livrar de você! Mas eu te amava demais para isso, sentia muito sua falta, era uma tortura sem fim! Tomei minha primeira dose.

É engraçado como hoje em dia todo mundo é muito igual... Você era diferente, eu ficava bobo só de ver você andando, passando por mim, seu cheiro, seu rebolado, seu sorriso de tirar suspiros de mim igual doce de criança. O mais triste era saber que meu erro não foi ter se apaixonado perdidamente por você, por que você havia se rendido a mim também. E a gente viveu um amor nuclear, de explosões constantes de paixão, de momentos mágicos e singulares. Eu me lembro de te buscar na porta da faculdade e de todo mundo olhar para a gente como se fossemos de um outro planeta. Era uma química muito forte, você era o oxigênio que faltava para a combustão do amor que havia dentro de mim. E só de pensar que agora eu estava apagado, mais cinza que o céu triste de agosto, eu bebia outra dose.

As pessoas tendem a mudar pelo outro, se adaptar, às vezes esquecem inclusive de ser quem elas realmente são. E a gente era simplesmente e puramente nós mesmos, sem máscaras ou disfarces. Era de uma aceitação impressionante, eu não sei como poderia existir maior admiração mútua, por sermos quem éramos de verdade. Como você pode ir embora enxergando isso? Como pode me abandonar sabendo que estávamos tão bem sintonizados? Eu sinceramente não consigo entender o que é tão mais urgente que dois corações que se amam perdidamente e estão predestinados a ser uma onda única unissonante de amor. Tomei a terceira dose.

Cabisbaixo, visivelmente triste e desiludido com a vida no meio da festa, alguém me tira para dançar e eu sei que é porque querem tentar me animar. E o fato de todo mundo saber como você fugiu covardemente de mim me deixa mais envergonhado de mim mesmo, de ter se aproximado de você e não ter previsto a explosão que viria. Eu bebi a quarta e a quinta dose pensando em como seria bom ter você ali comigo... Você tinha uma energia fortíssima quando se aproximava de mim, seus lábios me atraiam como polos inversos de um imã. Eu sentia todo o desejo do mundo concentrado no seu olhar sedutor fixo nos meus olhos. A gente dançava sensualmente em cima de um palco de cabaré, você puxava meu suspensório e minha gravata vermelha, eu descia a mão pelo seu corpete até a sua cintura e te apertava forte junto ao meu corpo, e logo mais você dava as costas para mim de novo... Não sinto falta de você, sinto sede de tomar cada gota de paixão que éramos juntos. Cada gota da minha sexta dose.

Eu já estava alucinando e invariavelmente conseguiria te esquecer, era tão óbvio! Mas eu insistia em ser idiota, por que eu precisava por para fora a dor de ter perdido a coisa mais linda que um dia já havia passado pela minha vida. Como você era sensual e doce ao mesmo tempo, como era forte e sensível, como era bela e inteligente, como era tudo o que eu jamais conseguiria descrever como perfeição nesse meu mundo tão cor de rosa. Aprendi a não me iludir com a vida, aprendi a não criar demasiadas expectativas nas pessoas. Obrigado por isso... acho.


Aquela noite eu pus cada gota de você para fora do meu corpo. A ressaca ainda se prolongou por dias afora, mas eu aprendi a dizer nunca mais para essa dor. Temos que aprender a experimentar outras vidas, em outros bares do nosso coração, em outras projeções da nossa visão. Tão limitado somos em buscar o que ainda não entendemos tão bem. A falta de amor próprio. 


***GOSTOU? Curte ai e siga a página no face!

Nenhum comentário:

Postar um comentário