Aqueles olhos grandes me seduziam
de forma espantosa, era meu êxtase diário de delírios, vinha acompanhado de uma
dose de sorrisos e um perfume que era escancarado ao meu rosto a cada brisa de
vento cintilando pelos vermelhos fios de cabelo que caiam sobre seus ombros.
Demorou, mas eu decidi me arriscar naquela aventura em forma de sonho. Aquele
anjo sorriu de volta e depois de tantas conversas ela me sentenciou de forma
que eu jamais poderia esquecer:
-Você me parece um cara
inteligente, eu acho que você pode conseguir me ajudar em uma coisa. Esse cubo
aqui era do meu pai, ele costumava dizer que era como a vida, por que nele há mais
de 43 quintilhões de possíveis formas de se ajustar e se você pudesse fotografar
uma forma por segundo ainda sim demoraria 1400 trilhões de anos pra se
visualizar todas. É como a nossa vida, a gente deve escolher como viver e
gastar nosso tempo vivendo dessa forma, garantindo que não haja milhões de
metamorfoses que nos façam perder os melhores momentos dessa curta jornada.
Meu cérebro começou a fritar, mas
como um bom amante dos números parecia intrigante e desafiador, eu fiquei ali
admirado com a firmeza nas palavras da garota.
-Eu quero que você o resolva,
deixe na forma mais simples possível, onde cada lado tem a sua devida cor, é
assim que eu espero viver a minha vida, de forma simples, organizada e feliz.
Você conseguiria me ajudar? – e sorriu desafiadoramente.
O dia foi longo, nada tirava
minha atenção, eu precisava resolver aquele treco, era tudo que eu tinha para
ter a garota dos meus sonhos. Horas e dias se passavam e nada, depois de
conseguir resolver partes eu precisava desmanchá-las para conseguir outras, era
desanimador, eram tantas possibilidades que chegava a parecer impossível
resolve-lo. Até mesmo tentando estabelecer critério e padrões matemáticos, era
inútil, e eu ficava imaginando que talvez apenas um gênio fosse capaz de
decifrar aquele enigma.
O coração sempre foi aberto a
sentimentos como esse, eu talvez nunca conseguiria resolver aquilo ali, mas de
certo eu jamais deixaria de tentar, isso era certo. Eu ficava recordando meus
avôs e o lindo romance que tinham construído por anos e anos de vida. Era
notável por todos a energia que emanava daquele casal de velhinhos cabeça
branca, décadas iam sendo escritas no livro do tempo e nada abalava aquela
paixão, nada mesmo, contagiante e de se emocionar com os mimos que eles trocavam,
e até o último segundo isso perdurou. Quando meu avô partiu dessa pra uma
melhor minha vó estava lá, debruçada sobre seu peito, deixando as lágrimas
rolarem e apertando forte a sua mão e dizendo em confidencia o quão
gratificante tinha sido passar todas as suas décadas de vida ao seu lado.
Todos em luto, e a pessoa em que
mais se haviam preocupado estava bem. Era impressionante a força da vovó,
ninguém poderia acreditar como ela continuava sorridente e feliz, vivendo cada
segundo e fazendo seus crochês lindos, como se nada tivesse acontecido. Foi
assim até mesmo depois que o câncer tomou conta do seu corpo frágil, e ela teve
os movimentos perdidos. Ela era forte, e até internada no hospital com a comida
ruim ela estava feliz e bem humorada, foram anos e anos de vida devido a essa
autoestima elevada, ela chegou a me contar o ‘segredo’, ela disse que não
importava o que aconteceria com ela, ela tinha aproveitado a vida do jeito que
ela sonhou, o amor prometido ao lado de vovô, foram mágicos ela dizia, e sem
dúvida ela deixaria esse mundo sorrindo, por que foi assim que ela passou por
ele ao lado do seu grande amor, e ela não estava errada, no dia em que faleceu
ela estava sorrindo, um sorriso tão largo que a morte parecia apenas um belo e confortável
sonho de criança.
Todas
as histórias em um flash e eu olhava para aquele bendito paralelepípedo
reto de arestas congruentes e
suspirava em pensar que poderia perder o amor da minha vida por um desafio
impossível.
Hoje,
depois de algumas décadas eu tenho algumas várias histórias para contar.
Principalmente a que diz respeito a como minhas manhãs eram felizes ao acordar
ao lado aqueles lindos olhos castanhos, que a cada dia eram mais lindos e
cheios de amor pra dar. Era o amor certo, e eu pude tê-lo só pra mim, em cada
ano da minha vida e desfrutá-lo de maneira genuína. Era impossível não sorrir
para aquele doce e belo rosto, que mesmo com o tempo trazia o conforto que eu
sempre desejei ter dentro de mim.
Como eu consegui? É uma boa
pergunta, eu ainda não posso acreditar que cheguei naquele dia, há muitos anos
atrás e entreguei o cubo desfeito, e simplesmente disse que era impossível, que
se a vida tivesse que ser daquela forma eu talvez nunca conseguisse, e que
certamente eu preferiria vive-la da maneira que eu sempre a vivi. Chega a ser
engraçado como eu conquistei aqueles olhos com essas palavras. Hoje, depois de décadas,
o cubo permanece entre a gente, e como eu disse que jamais desistiria, ele está
lá, só que desta vez totalmente resolvido. É um troféu do nosso amor, que eu
pude conquistar pouco a pouco traçando uma história ao lado do meu amor.
Mas a vida não acaba aqui, ela
sempre será feita de desafios, e o fim só chega quando o tempo acabar, até lá
nós vamos superando os obstáculos maiores, por que são eles que nos mantém
vivos e aquecidos dentro da vida das pessoas que amamos.
-Amor! Veja só o que eu comprei
hoje!
-Nossa querido! Assim você vive
por nós dois toda uma vida – dizia com o sorriso e os olhos grandes que eu
jamais vou esquecer.
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