Comfortably Numb - Pink Floyd
As
nuvens fechavam o céu estrelado e davam espaço para a escuridão. Gradualmente a
chuva despencava em gotas cada vez maiores, e os telhados faziam a sinfonia da
solidão. Os trovões ecoavam por longos segundos e os raios sequer eram vistos.
Dentro daqueles dez metros quadrados ele sentia o clima se alinhando com seu
corpo, que já exausto fica estirado no meio da cama. Olhou o teto, era branco,
podia jurar que aquela rachadura não existia ali até, sei lá, sempre. Pensou em
quantas chances teve de ver aquela rachadura abrindo e tomando conta do teto
todo, mas não, nunca viu. Agora estava ali de braços abertos, esperando que o
teto caísse sobre ele. Não caia, não existe nada ruim o suficiente que não se
possa piorar, e por isso o silêncio só se piorava com mais silêncio. Puxou com
as mãos a última dúzia de fios que faltavam arrancar da sua barba, pequenas
dores o faziam sentir vivo. As unhas acabaram, o dedo maior já sangrava, olhava
se perguntando quanto tempo levaria para crescer de novo, para que pudesse
comer de novo, a conclusão é que faltariam dedos afinal. Começou a puxar os
fios da sobrancelha, doíam mais, descobriu um doce novo prazer. Levantou sem por
que algum, rodeou o quarto, abriu todas as gavetas, vasculhou todos os livros,
revirou todas as tralhas. Nenhuma novidade, eram as mesmas de sempre, 5, 10, 20
anos ali. Sua mente era boa demais para que se surpreendesse com algo que por
algum acaso tivesse esquecido que existisse ali. Sentou na cadeira, tirou a
roupa, tentou ficar parado, mas as pernas balançavam como dois terremotos
dissonantes. O coração de repente acelerou, sem qualquer razão, e começou a
bater em sincronia com as pernas, a respiração descompassou e quase perdeu o
folego. A cabeça o levou para um futuro horrível, pensou no passado, se sentiu
mal também. Ficou vivendo um passado que gostaria de ter escrito e um futuro
que jamais existiria por horas, até que o suor frio encharcou todos os pelos
ainda restantes no seu corpo. Estendeu a mão para a cartela de calmantes e tomou
mais dois, mesmo sabendo que já havia se drogado o suficiente. A noite ia
descendo com pingos na janela, e do outro lado silêncio, fora daquele quarto
apenas vazio. Que música ouvir em situações como essa? Não conhecia nenhuma.
Assistir qualquer coisa lhe dava angústia só de pensar em ter que prestar
atenção. Tentou escrever alguma coisa, mas não tinha a menor força e vontade de
sequer criar parágrafos, soou depressivo demais até mesmo pros seus padrões.
Chorou... Duas, três vezes. Soluçou tão forte que teve de se agachar, deitou no
chão gelado e sentiu a pulsação das veias encostadas no piso. Os olhos inchados
já não enxergavam as rachaduras no teto. Levantou sem a menor pressa, a hora
não passava de jeito algum. Imaginou onde estariam as pessoas, o que elas
estariam vivendo, fazendo... Tentou piamente se interessar por qualquer coisa,
era falho. A escuridão lhe abraçava de volta naquela noite fria. Não tinha
costume de dormir cedo, mas fez toda a força que pode, a dor era muito grande
para ficar ali parado, existindo... Acordou no mesmo dia, e viveu tudo de novo,
mais outra e outra vez... Quando percebeu o que mais queria era dormir o quanto
antes fosse possível, e acordar o mais tarde que pudesse. Parecia uma excelente
ideia dormir, e dormir... Quem sabe a dor vá embora, quem sabe exista um jeito de
não ter mais pesadelos... Respirou fundo em frustração, covarde! Acendeu as luzes
e voltou para a cama, o mundo precisava de alguma forma que ele ficasse acordado,
sentindo... A rachadura continuava lá, entediante e cada vez menos interessante .
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