Abotoei
minha camisa xadrez e meus sonhos, olhei pela janela naquela noite, e senti
caindo por entre o vidro embaçado de umidade a escuridão e a ansiedade. Aprecei
meu passo, era quase hora. Contei 27 segundos olhando para o relógio e a chuva
começou a bater no telhado, esbocei um pequeno sorriso e me projetei pela porta
da frente.
Era um dia especial, e o frio esmurrava
meu rosto na tentativa de me cegar. Colhi algumas imagens da rua deserta, e
fiquei fantasiando mais um filme de horror. Eu não tinha mesmo pressa, a vida
era longa e castanha pelos olhos do cachorro molhado na rua.
Adiantei-me pelo beco escuro,
cortando caminho por ansiedade. A água escorria pelo asfalto e eu não a sentia
no meu rosto. Era uma mistura de desejos e dor que parecia romper a realidade,
fiquei observando...
O fogo queimava embaixo dos meus
olhos, refletia a brasa cortada pelas rajadas de chuva, e eu imaginei o tamanho
do pecado que trazia aquela fumaça, desafiando as leis da física. Ainda pude
olhar para os lados, buscando alguém naquela noite fria, mas o fogo se apagou e
continuei a caminhar.
Eu não queria chegar, mas já estava
molhado, ninguém me assistia nas ruas, e eu não tinha como transcender o meu mau
comportamento, olhei compulsivamente o relógio e não achei os números que queria.
Dei-me por vencido e segui cabisbaixo, além do mais era quase hora, e eu não
podia me atrasar, a vida era longa e eu tinha que atravessar o horizonte, para
encontrar a mim mesmo, além da chuva e da brasa gelada daquela noite, olhei uma
última vez o relógio e estiquei mais um sorriso, era quase hora.
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